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Por onde anda “A Casa da Senhora H”?

A pergunta que mais tenho respondido nos últimos tempos é “A quantas anda ‘A Casa da Senhora H’?”. Se por um lado me deixa imensamente feliz, por saber que tantas pessoas não esqueceram e continuam interessadas pelo romance, por outro me sinto em falta com os leitores e amigos que me acompanham. Por isso, com o início da nova fase do blog “Escrita em progresso” e a com a decisão de retomar e finalizar o livro, preparei este texto para esclarecer e explicar o que se passou e o que está por vir.

Esta semana completou-se exatos 4 anos que estive na Casa do Sol (Foto 1) para uma visita a convite do querido amigo Daniel Bilenky Mora Fuentes, Presidente do Instituto Hilda Hilst, para matarmos as saudades e acertamos detalhes da montagem de “As aves da noite”, uma das peças de Hilda Hilst que ele me convidou a dirigir. O retorno à Casa acabou inspirando outro projeto, que está se realizando antes da empreitada teatral e que tem me dado muito trabalho e muito prazer: o romance “A Casa da Senhora H”.

Naquela visita soube, através de Roberta Ferraz e Isadora Krieger, artistas residentes no Instituto, que o Edital da Funarte/ Biblioteca Nacional de concessão de bolsas de estímulo à criação literária estava aberto. Tendo recebido o apoio do Instituto Hilda Hilst para a pesquisa, integrado ao seu programa de Residências Artísticas, decidi inscrever uma proposta de criar um romance sobre a história da Casa do Sol, chácara construída por Hilda Hilst para se dedicar à literatura e compartilhar esse espaço com amigos e outros artistas e intelectuais.

Batizado inicialmente como “O romance da Casa”, o projeto foi aprovado, tendo sido o único selecionado de Minas Gerais, em dezembro de 2012, o que me deixou imensamente feliz, pois, pela primeira vez, ia me dedicar à literatura de ficção de forma profissional e sendo remunerado para isso, paralelamente às minhas atividades como dramaturgo, diretor e professor. Esclareço: escrevo muito (contos, romances, poemas, peças de teatro) desde o início da adolescência, mas acabei profissionalmente até agora explorando mais textos relacionados à comunicação, à dramaturgia e à escrita acadêmica, esta estimulada na época pela defesa da tese de Doutorado. 2012 foi um ano intenso, surpreendente e de virada.

Em janeiro de 2013 fiz minha primeira residência artística na Casa do Sol para pesquisa no acervo e preparação do romance. Foram dias mágicos, iluminados pela emoção de acessar um tesouro de fotografias, textos inéditos, cartas, cartões, documentos, bilhetes e objetos de Hilda Hilst e seus convivas. Essa residência foi encerrada com a mudança de nome do romance para “A Casa da Senhora H” e a escrita de um primeiro fragmento do texto, inspirado na única fotografia encontrada da Casa do Sol em construção. A experiência foi tão forte que, somada aos últimos acontecimentos da minha vida (os seis meses de Doutorado Sanduíche em Lisboa, a conclusão da pesquisa de tese e o projeto do romance), levou 2013 a ser um ano de transição e decisões, o que não costuma ser fácil e muitas vezes doloroso.

A parceria que vinha desenvolvendo com a Cia. Pierrot Lunar na dramaturgia, direção e orientação de pesquisa de linguagem sobre teatro narrativo, iniciada em 2006 com a montagem de “Atrás dos olhos das meninas sérias”, passando por “Sexo” (2010) e “Acontecimento em Vila Feliz” (2011) e outros tantos projetos, chegara ao fim com “#tudodenós”, espetáculo da primeira turma do Pierrot Teen, grupo de formação de jovens atores da companhia, com dramaturgia e direção minhas e de Léo Quintão. Questões inerentes à vida interna e particular do grupo e uma necessidade pessoal de autonomia sobre o trabalho me impeliram a retomar minha independência criativa.

Mudanças são importantes e necessárias, mas nem sempre acontecem de maneira indolor e sem mágoas. Ao mesmo tempo há o vazio do que finda e a ansiedade do que chega. Toda separação é uma pequena morte, que é o início de outra vida, uma vida nova que se espera próspera. Acredito que o tempo é capaz de transformar as perdas em saudade e boas lembranças. E agora relembro Rainer Maria Rilke, citado por Lya Luft em sua “Secreta Mirada”: “Começar mais uma vez, como uma criança...”. E assim, engatinhando e depois aprendendo a andar novamente, fui dando os primeiros passos.

Daquele período até o momento realizei outras três residências artísticas na Casa do Sol, que incluiu um inventário da Casa (sua planta, móveis, objetos, seres vivos e inanimados, jardins, histórias) e de seus Personagens através de inúmeras entrevistas e horas e horas de conversas boas e animadas, como costumam agradar um bom mineiro como eu, sobretudo se regadas a café ou vinho e muitos cigarros (ainda fumava muito na época), entabuladas com Olga Bilenky, Daniel Bilenky Mora Fuentes, Jurandy Valença, Edson da Costa Duarte (Vivo), Dante Casarini, Chico e tantos novos amigos residentes. E, ainda, a cada seara encontrada na pesquisa para “A Casa da Senhora H”, mais um universo de documentos, personagens e fatos se abria com mais e mais novidades.

O Edital da Funarte/ Biblioteca Nacional exigia que a escrita do livro deveria ser concluída em 6 (!) meses após o pagamento do valor da Bolsa que, por sua vez, demorou quase 9 meses para ser efetivado, visto está mais uma vez o descompromisso dos órgãos públicos com seus artistas trabalhadores. Ainda que o atraso da grana tenha me dado mais tempo para pesquisar e produzir, sabia por experiências anteriores que um romance não se escreve da noite para o dia, principalmente um desse tipo que envolve tanta pesquisa, tantos personagens e tantos documentos.

Entretanto, para honrar meu compromisso com a Bolsa de Criação Literária, escrevi uma “Primeira Versão” do romance, uma boa tentativa de organizar todo o material coletado nas residências e experimentar uma proposta narrativa, que incluiu a criação de um escritor-narrador, o Senhor A, e outras peripécias literárias. Todo o processo de pesquisa e escrita foi semanalmente registrado na coluna “Escrita em progresso” (que originou posteriormente este blog no meu site) que mantive durante 20 semanas na virtual Revista Literar (acesse todo o conteúdo aqui). Aliás, essa experiência de compartilhar a escrita com o público merecerá outro texto, aguardem!

Entreguei a “Primeira Versão” de “A Casa da Senhora H”, acompanhada de um Relatório Final, em abril de 2014 como conclusão do meu projeto, onde reforcei a complexidade do trabalho e que uma versão final ainda seria realizada. O edital previa que a Funarte/ Biblioteca Nacional poderiam escolher até três trabalhos para publicação resultantes de todas as bolsas concedidas, mas não fui contemplado e nunca recebi um retorno sobre isso. Aqui se faz importante outro esclarecimento: a bolsa recebida era para a escrita do livro e não para sua publicação (a não ser que eu decidisse utilizar o dinheiro para tal, o que não foi o caso, já que tive muitas despesas como hospedagem e alimentação nas residências no Instituto Hilda Hilst, além de direitos autorais da obra de Hilda Hilst e do acervo da casa e os inúmeros transportes Belo Horizonte-Campinas-Casa do Sol).

Deixei a “Primeira Versão” de “A Casa da Senhora H” de molho (ou cozinhando em banho-maria) e não imaginei que tanto tempo se passaria, pois fui atravessado por outros convites, trabalhos e projetos como os espetáculos “Marilyn Monroe.doc” (com o Grupo Dois Palitos), “Rita Lee vem jantar” (texto inédito para o Janela da Dramaturgia), “Valsas... experimentos rodrigueanos” (com Laís Rivera) e “EuCaio” (com Matheus Soriedem), este inclusive saído das páginas do romance, pois conta o período em que o escritor Caio Fernando Abreu viveu na Casa do Sol com Hilda na Ditadura Militar; a publicação do livro “Narrativas em cena” (originado da tese de Doutorado) e o ingresso como professor efetivo do Departamento de Comunicação Social da UFMG. Essas experiências, sem dúvida, foram muito importantes para a nova fase que se inicia agora.

Há dois dias, sem lembrar que se completavam 4 anos do início d’ “A Casa da Senhora H”, a partir da ocorrência de um texto inédito para o livro, decidi arregaçar as mangas e retomar a escrita da versão final do romance, para então buscar uma editora interessada em publicá-lo e assim fazê-lo chegar finalmente às mãos dos leitores. Há muito que reler e reescrever e todo o processo será novamente documentado e compartilhado aqui no blog, incluindo a publicação de trechos inéditos e curiosidades sobre o trabalho. Os processos são espiralados e acredito que nada acontece por acaso. Não obstante, minha carta tirada hoje no Tarô, o “Sol” (!), o Arcano XVIII que tudo ilumina, “sugere que é chegada a hora jogar claramente e agir com o máximo de confiança possível. A luz afugenta a escuridão e tudo é visto da forma mais transparente, honesta e franca possível”.

É preciso confiar e agradecer! Obrigado a todos que acompanham, leem e retornam com mensagens, comentários, curtidas e compartilhamentos. É incrível e maravilhoso ser escritor numa época em que não há mais distância e silêncio com os leitores. Ainda que o blog não mais se restrinja à “Casa da Senhora H”, pois também está aberto a outros textos e criações, venha sempre, fique à vontade e boas leituras!

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